Dirigir é respirar junto

A Preparação do Diretor é uma dessas leituras que não soltam da pele.

Anne Bogart mergulha de cabeça nos desafios do fazer teatral e fala com uma franqueza rara sobre a coragem de criar arte.

Ela identifica sete forças — parceiras e inimigas do processo criativo — que, se bem escutadas, podem se tornar fontes poderosas de energia: violência, memória, terror, erotismo, estereótipo, timidez e resistência.

Cada uma dessas palavras carrega um vulcão dentro. E, segundo Bogart, o segredo está em entrar em parceria com elas.

Vivemos numa era em que o sucesso só é reconhecido quando passa pela televisão. O aplauso fácil vai para quem vende bem. Mas no teatro, o jogo é outro.

A violência exigida de um ator em cena é diferente da violência pedida pela câmera.

No cinema, um momento pode acontecer por impulso. Não precisa se repetir — só precisa ser espontâneo e bonito no quadro.

Já no teatro, esse mesmo momento tem que ser repetido noite após noite. E ainda assim, parecer vivo. Inesperado. Incômodo.

Tudo no palco precisa ser carregado de presença. As palavras, as ações, os gestos. Especialmente as palavras gastas de tanto uso. Como “eu te amo”. Que só voltam a ter sentido quando são quebradas, distorcidas, entregues por outro ângulo. Só assim elas voltam a ser audíveis. Sentidas.

O ator — como o artista de striptease — revela escondendo.

É na contenção física, na tensão do que não se mostra, que mora a expansão emocional. E isso vale pra todo artista.

O material que temos nas mãos — um texto, uma ideia, uma imagem — precisa ser tratado como algo vivo. Indomado. Maior do que nós. Só assim ele se abre, desafia e revela a sua própria magnitude.

Anne também provoca os jovens diretores: muitos acham que dirigir é mandar, controlar, impor visão.

Mas pra ela, dirigir é sentir. Estar na sala. Respirar junto. Mergulhar com o outro no desconhecido. E confiar que algo vai surgir.

O desconforto, diz ela, é um mestre generoso.

É ele que sacode a poeira, que faz a faísca saltar. E se a gente tentar domar o processo, ele murcha. Se a gente o reverencia como algo maior do que nós, ele floresce.

No fim do livro, ela deixa um conselho que vale ser tatuado: não espere as condições ideais. Tempo, dinheiro, reconhecimento — tudo isso pode nunca chegar. Trabalhe com o que você tem agora. Esse agora vai moldar o que virá depois.

E seja paciente.